Europa 51
Sem Credos Nem Ideais
Devido a uma tragédia familiar, Irene Girard abandona a rotina de socialite de outrora
e, como expiação dos próprios pecados, passa a se dedicar as pessoas necessitadas
de apoio. Suas motivações, dentro deste contexto, não possuem conotação religiosa e/ou política - o que explica seus bastante representativos olhares de enfado perante um
padre e um socialista.
A partir dessa breve introdução, Europa 51 (Itália, 1952)
há de ser escrutinado com esteio na ótica de Jean-Michel Frodon que afirma ser o longa-metragem uma: “inédita fusão do melodrama como gênero
popular com o filme de autor, com suas preocupações éticas e sociais“¹,
resultado obtido graças a habilidade de Roberto Rossellini que impregna uma história aparentemente novelesca
com provocações de teor político-humanitário sem que isso soe como um manifesto
tedioso. Com efeito, o cineasta não impõe ideais, mas apenas os sugere ou cita, sendo neste
diapasão emblemática a sequência em que Irene é consolada por um amigo que a
incentiva a não se sentir culpada pela morte do filho, já que tal culpa seria
na verdade da sociedade que forçou uma criança a enfrentar seus primeiros anos de
vida em meio aos horrores da II Guerra Mundial. Feita tal declaração surge a
preocupação: estaria Rossellini impondo sobre o espectador o nocivo pensamento
da coletivização da culpa?
Será que o diretor tentara convencer a plateia que praticantes de atos vis
hão de ser compreendidos já que antes de qualquer coisa são vítimas da sociedade
e do sistema ou será esta uma chacoalhada praticada tão somente para tirar o público
da zona de conforto, forçando-o, desta feita, a tecer suas próprias conclusões?
A resposta chega já perto do término quando Irene afirma que sua motivação não é
o amor ao próximo e sim o ódio a si mesma. Desse modo, Rossellini além de rechaçar a
ótica da coletivização da culpa,
afasta qualquer tentativa de canonização da protagonista e de quebra ainda
demonstra que mesmo egoístas podemos ser úteis aos demais.
Tantas nuances, cabe salientar, não seriam tão exitosas sem uma atriz competente
o suficiente para encarná-las, missão que Ingrid Bergman cumpre com inegável
talento, vide os olhares densos que ora mostram a dor da personagem ora apontam
sua aura resignada, conformismo esse que possui um teor bastante significativo,
pois se no início de sua jornada Irene estranha semelhante comportamento das
classes desfavorecidas perante a penúria do pós-guerra, ao fim do
longa-metragem é a própria protagonista que assim se comporta ante a opressão
que passa a sofrer de seus antigos pares.
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1.1001 Filmes Para
Ver Antes de Morrer. Rio de Janeiro: Sextante, 2010. p. 271.
Ficha
Técnica
Direção: Roberto Rossellini
Roteiro: Roberto Rossellini,
Sandro De Feo, Mario Pannunzio, Ivo Perilli, Brunello Rondi
Produção: Roberto Rossellini, Dino de Laurentis, Carlo
Ponti
Elenco: Ingrid Bergman, Alexander
Knox, Ettore Giannini, Giulietta Masina, Tina Perna, Sandro Franchina, Teresa
Pellati, Alberto Plebani, Alfred Brown, Maria Zanoli, William Tubbs
Fotografia:
Aldo Tonti
Montagem: Jolanda
Benvenuti
Trilha
Sonora: Renzo Rossellini
Estreia: 04.12.1952
Duração: 113 min.
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