Mr. Nobody


E Se?

Escolhas que caracterizam uma trajetória, caminhos percorridos, opções ora certas ora erradas. E se determinada conduta houvesse sido escolhida no lugar daquela que, no fim, gerou arrependimento? E se?

                 Mr. Nobody (Canadá, 2009) explora hipóteses extremamente amplas, mas também deveras intrínsecas a todos, valendo-se para tanto de um verniz futurista cuja real intenção é abrir caminho para uma toada surrealista possuidora de liberdade suficiente para permitir o livre trânsito do longa-metragem entre diversos tempos e espaços.
Neste diapasão, a obra que inicialmente pode parecer um tanto quanto intricada vai aos poucos conquistando o espectador ao revelar sua verdadeira natureza, qual seja a de um filme genuinamente romântico que, tal qual Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças (Eternal Sunshine of the Spotless Mind, EUA, 2004), explora possibilidades fantasiadas por qualquer coração despedaçado.
Indo além, o universo de sonhos que povoa o imaginário humano consiste em temática, por certo, fomentadora de comparações entre a obra em questão e o acelerado A Origem (Inception, EUA, 2010) de Christopher Nolan. Ocorre que o ritmo de Mr. Nobody é outro, sendo, na verdade, um trabalho bem mais instigante quanto a leitura das informações filosóficas, científicas e metalinguísticas embutidas nas entrelinhas, além de consideravelmente mais tocante e delicado no que concerne o aspecto dos amores nem sempre bem sucedidos do protagonista.
Discorrer sobre um mosaico tão vasto de ideias não é tarefa simples, razão pela qual de vital importância se mostra para o êxito do filme sua magnífica montagem que - sem incidir no equívoco da sobreposição de enredos - detém o mérito de conciliar com destreza as idas e vindas do personagem Nemo por entre as várias formas de futuro para ele surgidas.
Some-se a isso uma trilha sonora impecável quanto a pontuação das cenas, bem como os eficientes trabalhos de direção de arte e de fotografia responsáveis por conferir ao longa uma beleza plástica que, por ser ao mesmo tempo discreta, não comete o erro de tentar se tornar o foco principal da produção.

Graças as suas múltiplas qualidades, Mr. Nobody soma pontos ao currículo de Jared Leto – cuja filmografia, vale lembrar, é marcada por obras do quilate de Clube da Luta (Fight Club, EUA, 1999) e Réquiem Para um Sonho (Requiem for a Dream, EUA, 2000) – assim como serve de vitrine ao talento e ao nome do diretor Jaco van Dormael¹, cineasta cujos próximos trabalhos merecerão a devida atenção, dado o admirável compromisso por ele demonstrado quanto a realização do chamado cinema de arte.
Ok, a sequência final de Mr. Nobody indica uma inegável preocupação para com o encadeamento lógico dos eventos narrados, revelando, assim, certo quê de cautela mercadológica, cuidado que, num mundo perfeito, poderia ser facilmente dispensado em razão do viés surrealista adotado – estilo que, como sabido, autoriza sem qualquer pudor a relativização da lógica. Ainda que não seja possível ignorar a existência de tal senão, há de ser dito, contudo, que o peso do mesmo na balança não é grande o bastante para comprometer a grandiosidade do enredo escrito por Dormael nem sua respectiva conclusão de que na vida pouco importa se o ponto de chegada não é exatamente igual ao idealizado, tendo em vista que é o meio, a trajetória percorrida que lhe imprime sentido. Mr. Nobody, desta feita, lembra o espectador que são as decisões tomadas ao longo do percurso e as experiências a partir dele acumuladas que enriquecem o homem, lição que pode a princípio soar como uma obviedade, mas que a produção apresenta com um frescor tocante.
__________________________________________________
1.     Pode-se imaginar que o nome do diretor Jaco Van Dormael seja o de um iniciante. Mas, não é. Esse belga [...] já ganhou prêmio em Cannes e ainda foi indicado ao BAFTA e ao Leão de Ouro em Veneza (nesse caso, por Mr. Nobody)” (Fonte: http://cinemaeargumento.wordpress.com/2010/07/23/mr-nobody/).

Ficha Técnica

Direção e Roteiro: Jaco Van Dormael
Produção: Philippe Godeau
Elenco: Diane Kruger (Anna)Laurent Capelluto, Ben Mansfield (Stefano)Linh Dan Pham (Jeanne)Daniel Mays (Jornalista)Clare Stone (Elise - 16)Chiara Caselli (Clara)Harold P. Manning (Jornalista da TV)Valentijn Dhaenens (Julian)Katharina Pejcic (Filha de Anna)Juno Temple (Anna - 16)Alexander Türk (Filho de Anna)Thomas Byrne (Nemo - 9)Daniel Brochu (Peter)Jared Leto (Nemo Nobody)Sarah Polley (Elise)Natasha Little (Mãe de Nemo)Rhys Ifans (pai de Nemo), Toby Regbo (Nemo - 16)
Música: Pierre van Dormael
Fotografia: Christophe Beaucarne
Estreia Mundial: 2011
Duração: 138 min.

Comentários

Postar um comentário

LEIA TAMBÉM