Anos 90

Cru e Singelo

É impossível assistir Anos 90 (EUA, 2018) sem lembrar de Larry Clark e seu clássico Kids (EUA, 1995) dadas as similitudes entre as narrativas que discorrem sobre o cotidiano de jovens americanos precocemente envolvidos com sexo e drogas. A estreia na direção de Jonah Hill não almeja, contudo, ser tão crua quanto o trabalho de Clark, vide a opção por uma toada que a despeito dos assuntos tratados também consegue ser por vezes singela¹. Não fosse o bastante, outro fator que confere a Anos 90 uma identidade que o impede de ser tratado como mera repetição de ideias pretéritas é a concentração do enredo em torno de um personagem principal, protagonismo esse que Kids não faz tanta questão de ter  ao preferir diluir de maneira equânime entre personagens diversos os dramas relatados.

E que figura bem desenvolvida e interpretada é o protagonista Stevie (!) defendido com unhas e dentes pela revelação  Sunny Suljic, ator com capacidade para ser um dos futuros grandes nomes da indústria cinematográfica, a julgar pela graça e talento demonstrados, êxito esse que se deve em parte a habilidosa condução de Jonah Hill que, aparentemente sem grande esforço, consegue extrair interpretações naturalistas de seu elenco. Aliás, a qualidade do desempenho do agora cineasta também se mostra por meio das corretas escolhas por ele feitas seja quanto a recriação do período noventista, aspecto esse em que sua sutileza envolve desde citações apenas pontuais sobre elementos culturais da época² - e que, desta feita, seguram o ímpeto da nostalgia em excesso para que esta não se suplante sobre a narrativa - até a seleção de músicas que, exceto por uma citação ao Nirvana, fogem ao óbvio daquilo que logo vem a mente quando se pensa em tal década.

Talvez faça falta ao longa-metragem um aproveitamento maior de um personagem com potencial para tanto, qual seja Ian (Lucas Hedges), o irmão mais velho de Stevie, vacilo que, entretanto, não compromete e que parece ter sido fruto da decisão de enxugar a trama para, desse modo, não ser dado um passo maior que as pernas. Por certo, novas empreitadas atrás das câmeras haverão de conferir a Hill a segurança para ir além e tratar de assuntos ainda mais complexos sempre quando possível.

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1.Como bem observa Sara Cerqueira: “No maior estilo hangout movie (onde o foco reside em situações cotidianas de entrosamento entre personagens, e nada realmente grandioso acontece), o longa acompanha o início da vida social de um adolescente que, em busca de refúgio de um lar fragmentado, se sente acolhido entre jovens com vidas semelhantes. Não há glamourização da juventude, nem grandes aventuras, nem fantasia, nem magia: há apenas incertezas, micro violências cotidianas, resiliência às mesmas e amor entre amigos” (disponível em https://www.cineclick.com.br/criticas/anos-90. Acesso em 29/07/2019).

2. Dentro deste contexto, Bruno Carmelo chama atenção ao fato de que: “Jonah Hill decidiu criar um projeto que parece ter saído diretamente daquela época – em outras palavras, um filme que não seria sobre os anos 1990, mas dos anos 1990. O formato da imagem, de 1x1:33, evoca diretamente a proporção televisiva, mais quadrada do que a maioria das projeções de cinema, enquanto a textura granulada do 16mm remete à época pré-digital” (disponível em: http://www.adorocinema.com/filmes/filme-246281/criticas-adorocinema/ Acesso em 29/07/2019).

Ficha Técnica

Título Original: Mid 90's

Direção  e Roteiro: Jonah Hill

Produção: Aaron Meza, Alison Goodwin, Amanda Adelson, Catherine Farrell, Eli Bush, Jonah Hill, Josh Rosenbaum, Ken Kao, Lila Yacoub, Mikey Alfred, Scott Rudin

Elenco: Aaron Meza, Alexa Demie, Ama Elsesser, Aramis Hudson, Chad Muska, Donovon Piscopo, Fig Camila Abner, Gio Galicia, Judah Estrella Borunda, Katherine Waterston, Kevin White, Liana Perlich, Lucas Hedges, Mecca Allen, Na-kel Smith, Olan Prenatt, Rick Howard, Ryder McLaughlin, Sonny Greenback, Sunny Suljic

Fotografia: Christopher Blauvelt

Trilha Sonora: Atticus Ross, Trent Reznor

Montagem: Nick Houy

Duração: 85 min.