O Barato de Iacanga


Viva a Sociedade Alternativa
O Barato de Iacanga (Brasil, 2019) é um saborosíssimo retrato da existência da contracultura no Brasil em pleno regime militar. Nesta toada, o documentário além de discorrer sobre os festivais de música de Águas Claras, espécie de Woodstock brasileiro, aproveita para refletir sobre o quanto o comportamento flower power dos jovens daquela geração consistia também em uma espécie de resistência por aqueles que em nome da paz se recusavam a integrar a luta armada.
Dentro deste contexto, interessa para a narrativa abordar não necessariamente as estrelas que subiram nos palcos daquelas festividades e sim focar sobretudo nas pessoas que estiveram por trás da organização dos eventos, no que se inclui a paixão com que o faziam e com que se referem até hoje sobre tais tempos, o que garante inúmeras histórias curiosas que cativam até o mais turrão dos espectadores.

Com efeito, o documentarista Thiago Mattar é sábio ao deixar que os envolvidos falem por si, não se valendo, desta feita, de recursos narrativos voltados a moldar um juízo de valor: quem lembra nostálgico daquele período tem voz tal como quem permanece não vendo com bons olhos a conduta dos hippies que, não raro nus, invadiram a pacata cidade Iacanga.
Neste diapasão, resta bastante acertada a maneira com que o diretor, por exemplo, fraciona a entrevista dada por um aliado dos militares, qual seja o fotógrafo policial que a pedido de sua corporação registrou o festival para que pudesse o material ser avaliado pelos censores preocupados com a ameaça libertária que aquela juventude representava. Hoje um senhor, tal figura de início tem uma fala que parece de identificação com o comportamento daqueles que à época tinham idade parecida com a sua, discurso que aos poucos vai se mostrando reacionário e, portanto, de contraponto àquilo que o filme enaltece, confronto de ideias esse que é mostrado sem alarde para que não soe como um julgamento sobre aquele ser que se dispôs a falar, daí ficar ao encargo de quem assiste tecer suas próprias conclusões a respeito do que é mostrado, impressão que também se aplica a abordagem dos erros cometidos pelo principal idealizador do festival quando de sua quarta edição: os vacilos são elencados e cada um dá a eles o peso que desejar, afinal, acima de tudo, o que o documentário almeja não é fazer críticas ou lamentos¹, mas sim saudar a atitude rebelde e corajosa daqueles jovens, bem como o inestimável valor da música brasileira.
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1.Circunstância que talvez explique o fato de nem sempre o filme explicar muito bem de onde saíam os recursos financeiros para a pré-produção de eventos de tal porte.


FICHA TÉCNICA

Direção: Thiago Mattar
Roteiro: Thiago Mattar, Guilherme Algon
Duração: 93 min.

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