O Quarto de Jack
Nó na Garganta
É
difícil ser objetivo diante de uma obra tão tocante quanto O Quarto de Jack (Canadá/Irlanda, 2015). O drama emociona, provoca nó
na garganta e, o que é melhor, sem jamais soar como um dramalhão ainda que
grandes os riscos de assim se comportar.
De
considerável importância para o êxito do resultado final, o meticuloso roteiro
– adaptado pela própria autora da obra original – cinde a narrativa em dois
atos respectivamente marcados pela clausura e liberdade. Nesta toada, durante a
prisão salta aos olhos a forma lúdica com que a personagem feminina tenta
driblar a crueza da realidade para garantir o mínimo de inocência a infância de
seu filho e adiante o incisivo rompimento dessa tática quando expõe a verdade àquele,
revelando a existência de um mundo além das quatro paredes do quarto onde vivem,
o que, por óbvio, provoca a negação e o desespero de uma criança que vê todas
suas certezas ruírem. Carregados das emoções a eles inerentes tais momentos por
si só já renderiam um ótimo filme, mas eis que O Quarto de Jack leva além a abordagem e o êxito de sua narrativa ao
se debruçar sobre os acontecimentos posteriores ao retorno/chegada ao mundo
exterior; nessa etapa o filme cresce vertiginosamente ao mostrar com delicadeza
ímpar o estranhamento de Jack perante uma realidade que imaginava existir
apenas na televisão, bem como a depressão de sua mãe frente os traumas
experimentados nos anos de prisão e o questionamento a ela dirigido quanto até
que ponto agira de modo correto ao manter a criança consigo ao invés de tê-la
mandado embora através de seu carcereiro logo nos primeiros meses de vida
daquela.
E
não para por aí: o longa-metragem também dedica precioso espaço a dificuldade
experimentada por aqueles que desse lado ficaram ao tentar reencaixar em suas
vidas quem há muito se fora e que a princípio sequer retornaria. Some-se a isso
o preconceito do qual Jack é vítima por parte do avô - haja vista ser o menino
fruto dos reiterados abusos sexuais sofridos pela mãe durante o cárcere - e o
que se tem é um exemplo raro de completude narrativa em que aspectos diversos
e, sem exceção, importantes da história são abordados a contento ao mesmo tempo
em que ramificações são sumariamente descartadas porque não interessam aos
protagonistas. Para Jack e sua genitora pouco importa ter notícias do avô
preconceituoso ou até mesmo do homem que lhes aprisionara; com efeito, a forma
ríspida com que tais figuras são limadas da trama se coaduna com o desejo
daqueles primeiros de aproveitar aquilo que de bom o mundo e as demais pessoas têm
a oferecer, possibilidade essa resumida em duas lindas sequências, quais sejam
a da fuga de Jack quando este se depara com uma inédita natureza, bem como
quando, sob o olhar de felicidade da mãe, consegue pela primeira vez brincar
com outra criança. Tais cenas reluzem o cuidado e sensibilidade do cineasta
Lenny Abrahamson que agrega suavidade a uma história tão dura, além, é claro,
do talento de Jacob Tremblay que parece nascido,
talhado para o papel que interpreta – é comum atores prodígios não conseguirem
repetir na adolescência ou fase adulta as brilhantes performances apresentadas
na infância, vide os casos de Anna Paquin, Haley Joel Osment, Abigail Breslin e Chloë
Grace Moretz, porém, qualquer que
seja o futuro, é certo que será eterno o deleite de vê-lo ao lado da também
ótima Brie Larson numa interpretação que atende a todos os anseios da trama e
de seu diretor no que significa emocionar sem ser apelativo.
Graças
a conjunção de suas qualidades, o impacto causado por O Quarto de Jack é o mesmo quer o espectador saiba ou não como se
desenvolverá o enredo. Um triunfo, portanto.
FICHA
TÉCNICA
Título Original: Room
Direção: Lenny
Abrahamson
Roteiro: Emma
Donoghue
Elenco: Brie
Larson, Jacob Tremblay, Cas Anvar, Jack Fulton, Jacob Tremblay, Jee-Yun Lee,
Joan Allen, Joe Pingue, Justin Mader, Kate Drummond, Matt Gordon, Ola Sturik,
Randal Edwards, Rodrigo Fernandez-Stoll, Rory O'Shea, Sandy McMaster, Sean
Bridgers, Tom McCamus, Wendy Crewson, William H. Macy, Amanda Brugel, Zarrin
Darnell-Martin
Produção: David
Gross, Ed Guiney
Fotografia: Danny
Cohen
Montagem: Nathan
Nugent
Trilha
Sonora: Stephen Rennicks
Estreia: 18/02/2016
(Brasil)
Duração:
118 min.
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