Calmaria


Flertando com o Absurdo

Em resumo o enredo de Calmaria (EUA, 2018) consiste em mais uma releitura de Pacto de Sangue (EUA, 1944) e seu clássico plot da mulher sedutora que busca o assassinato do marido pelas mãos do amante para que juntos gozem melhores condições financeiras¹. O clima noir de conotações urbanas e soturnas da obra de Billy Wilder é transplantado para um ensolarado ambiente praiano no longa-metragem estrelado por Matthew McConaughey (medida que se parece com a opção de filmar um western no gelo) e, dentro deste contexto, para que a pretensa originalidade da obra em comento não fique restrita a tal transgressão espacial, é inserido na já tão repetida trama um subtexto tecnológico, um tanto chupinhado de Matrix (EUA, 1999), que flerta com o surrealismo e que é responsável por retirar a sobriedade do roteiro, além de torná-lo não raro previsível - ademais, não colabora para tornar menos criticável o resultado as ocasiões em que  o cineasta Steven Knight emula David Lynch em certas composições de plano e de personagens que tentam ser estranhas, bizarras, mas que resultam insignificantes porque pobres em conteúdo.

Em Calmaria a vontade de ousar, inovar faz com que o produto se revele pior do que uma cópia genérica, saldo negativo que até poderia ser minimizado por um bom elenco, possibilidade essa que, entretanto, não vinga graças ao desigual nível de qualidade dos trabalhos de interpretação, afinal:
- McConaughey desenvolve com facilidade mais um tipo perturbado (tal como rotineiramente persegue em sua filmografia), performance que é enriquecida pela atuação acima da média de Jason Clarke que, por seu turno, assume o papel do consorte violento cuja vida corre risco;
- Anne Hathaway , lamentavelmente, está anos-luz de distância de ser uma femme fatale memorável, desempenho que um tanto reflete a ineficiência de um thriller que sequer consegue ser marcante através de seu teor erótico, eis que pífio, e que, desta feita, tem chance de ser lembrado tão somente pelas fantasiosas e um tanto infantis soluções de seu roteiro.
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1.    Conforme observa Heitor Romero: “a obra-prima de Wilder virou uma referência que foi muito copiada [...]. Tanto que sua sinopse parece uma das mais comuns e recorrentes na memória coletiva do cinema americano” (Um noir definitivo. Disponível em: http://www.cineplayers.com/critica/pacto-de-sangue/2278. Acesso em 10/03/2019).


FICHA TÉCNICA

Título Original: Serenity
Direção e Roteiro: Steven Knight
Produção: Andreas Habermeyer, Compton Ross, Greg Shapiro, Guy Heeley, Steven Knight
Elenco: Anne Hathaway, Diane Lane, Djimon Hounsou, Edeen Bhugeloo, Garion Dowds, Guillaume Silavant, Jason Clarke, Jeremy Strong, Kenneth Fok, Matthew McConaughey, Rafael Sayegh, Robert Hobbs, Vinaya Sungkur
Fotografia: Jess Hall
Trilha Sonora: Benjamin Wallfisch
Montagem: Jess Hall
Estreia: 28/02/2019 (Brasil)
Duração: 106 min

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