O Sal da Terra / Revelando Sebastião Salgado
Olhares
Revelando Sebastião
Salgado (Brasil, 2012) e O
Sal da Terra (Brasil/França/Itália, 20014) são obras bastante parecidas e
ao mesmo tempo consideravelmente distintas uma da outra. Na verdade, o primeiro
título serve de esboço para o documentário de Win Wenders seja por conta das
nítidas diferenças orçamentárias entre um filme e outro seja porque o cineasta
alemão junto com o codiretor Juliano Ribeiro Salgado evita, na medida do
possível, repetir temas já abordados no trabalho de Betse De Paula, aprofundando-se,
por conseguinte, em assuntos pouco explorados naquele. Já no que atine aquilo
que existe de comum entre os dois, além, é lógico, do biografado, há sobretudo o
enorme prazer demonstrado por este ao contar as histórias por trás de suas
icônicas fotografias e de suas viagens aos cantos mais remotos do planeta.
Por seu turno, Revelando
Sebastião Salgado se passa quase integralmente no interior do apartamento
do fotógrafo em Paris – o que, convenhamos, denota os poucos recursos da
empreitada – local onde ele tece comentários sobre os livros lançados e acerca
da sua trajetória de vida e de carreira – no que se destaca um assunto tabu,
qual seja o flagrante do atentado ao então presidente Ronald Reagan. Sabedora
de que a simples entrevista resultaria cansativa ao espectador, Betse De Paula,
no afã de ilustrar o depoimento, insere ao longo do mesmo registros
fotográficos e uma incômoda espécie de sonoplastia que infantiliza o relato.
Desse modo, a documentarista faz um apanhado da figura do fotógrafo e do homem
Sebastião Salgado de maneira abrangente e até escorreita – apesar das
limitações supracitadas, bem como da malfadada edição sonora – que não chega,
entretanto, a comover, mérito esse, de outro lado, alcançado por Win Wenders
que logra o êxito de deixar a platéia aturdida com as imagens captadas pelo
fotógrafo tal como almejado por este.
Tamanho resultado positivo de O Sal da Terra, vale dizer, se deve a ambientação dada ao
depoimento – não raro o que se vê é apenas o rosto de Salgado circundado por um
fundo negro, daí ser maior a imersão da plateia na sua fala – bem como às
filmagens feitas durante algumas de suas viagens, o que possibilita uma melhor
compreensão do quão trabalhoso, complexo e solitário é o seu ofício. Como dito,
toda a reação pretendida pelo fotógrafo ante seus registros é sentida pelo espectador
que, ao término da sessão de O Sal da
Terra, resta tão angustiado quanto maravilhado com o que vira, êxito esse
deveras facilitado pelo trabalho de Win Wenders que, além da contextualização das
fotografias, ainda encontra tempo e espaço no filme para tratar da criação do
Instituto Terra por parte de Salgado e sua mulher Lélia – tal abordagem, frise-se,
poderia facilmente fazer o longa-metragem perder seu foco, equívoco que
felizmente não acontece em razão de Wenders arquitetar o correto e necessário link entre a inauguração do espaço e o
Projeto Gênesis¹ preservando, assim, a coesão do documentário.
Muitos afirmaram que O Sal da Terra não explorara a contento a conturbada relação de
Salgado com seu filho, o codiretor Juliano Ribeiro. Todavia, ao que parece em
momento algum a intenção de Wenders fora se debruçar sobre tal drama familiar,
daí optar por apenas mencionar que: sim, a carreira do fotógrafo lhe exigiu
sacrifícios consideráveis dentre os quais permanecer temporadas longe da
família talvez tenha sido o maior. Dessa maneira, Wenders jamais faz da relação
pai e filho o foco primordial da produção, demonstrando, portanto, respeito
para com aqueles, além de inteligência quanto a eleição daquilo que de fato
importa: a carreira e o talento de Sebastião Salgado, sendo os reflexos
positivos e negativos destes mantidos como subtemas, o que dribla, por exemplo,
a possibilidade do documentário resvalar num novelão familiar.
Curiosamente, embora Wenders não demonstre acanhamento ao se lançar
como um personagem do documentário na medida em que já o inicia explicando o
porquê de sua fascinação pelo trabalho de Salgado, o codiretor Juliano Salgado
tem uma participação bem mais discreta em O
Sal da Terra – o que reforça os argumentos daqueles que pretendiam ver na
tela os mencionados problemas familiares. Neste sentido, maiores impressões de
Juliano sobre o pai podem ser vistas em Revelando
Sebastião Salgado, cujo roteiro é assinado pelo mesmo em conjunto com Betse
De Paula. Como dito alhures, aquilo que um filme fez o outro evita repetir,
motivo pelo qual se complementam em meio as suas enormes semelhanças e
diferenças.
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1.Expedição de
Sebastião Salgado que teve como meta registrar regiões e civilizações
longínquas ainda inexploradas.
FICHA TÉCNICA – O SAL DA TERRA
Título Original: Le
Sel de La Terre, 2014
Direção: Juliano Ribeiro Salgado,
Win Wenders
Roteiro: Camille Delafon,
David Rosier
Produção: David Rosier
Fotografia: Hugo Barbier,
Juliano Ribeiro Salgado
Montagem: Maxine Goedicke,
Rob Myers
Trilha Sonora: Laurent Petitgand
Estreia: 26/03/2015
(Brasil)
Duração: 110 min.
FICHA TÉCNICA – Revelando
Sebastião Salgado
Direção: Betse De Paula
Roteiro: Betse De Paula,
Juliano Salgado
Produção: Patrícia Chamon
Fotografia: ABC, Jacques
Cheuiche
Montagem: Dominique Pâris
Trilha Sonora: Naná Vasconcelos
Duração: 75 min.
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