Permanência
A Introspecção
do Conflito
Segundo David Howard e Edward
Mabley:
“O conflito
é ingrediente essencial de qualquer trabalho dramático, [...] é o próprio motor
que impele a história adiante, ele fornece movimento e energia à história.
[...] Sem conflito, o filme não deslancha. [...] Existe uma tendência, entre
roteiristas iniciantes, de pensar em conflito em termos de berros, armas,
punhos e outras formas de comportamento extremo. [...] na verdade, não se cria
conflito com histrionices ou comportamentos exagerados e sim com um personagem
querendo algo que é difícil de obter ou conseguir”¹.
À primeira vista inexiste conflito
em Permanência (Brasil, 2014), drama
que narra o reencontro de um casal de ex-namorados anos após o término do
relacionamento amoroso. Ela, já casada e residente em São Paulo, hospeda em seu
apartamento o antigo namorado, fotógrafo, recém-chegado de Recife para a
abertura da primeira exposição de suas imagens na capital paulista. A retomada
desse contato entre os dois, ao contrário do que pode aguardar o espectador,
não suscita crise visível no matrimônio dela nem embates entre os amantes de
anos atrás. Com efeito, uma total ausência de clímax afasta o longa-metragem de
qualquer fórmula fílmica e o aproxima da vida real tão repleta de vazios,
silêncios e tempos mortos.
Neste diapasão, é nas mentes da
dupla de protagonistas que todo o conflito da trama reside; afinal, são seus
preceitos e conceitos que logo tratam de afastar seus corpos despertados por
uma atração sexual e afetuosa que o tempo tratara de adormecer. Trocando em
miúdos, ainda que o reencontro traga a tona um turbilhão de emoções, o respeito
pelo casamento dela insiste em falar mais alto provocando uma confusão de
sentimentos.
Assim, se por um lado ela foge de
uma sala de cinema quando suas mãos começam a acariciar e serem acariciadas
pelas mãos dele, por outro lado, ela também se sente a vontade para caminhar
nua até ele num momento de despedida, denotando, desta feita, a dubiedade
existente entre o formalismo de hoje que os deixa sem saber o que conversar e a
sensação de intimidade de outrora que os impele um ao encontro do outro.
Dentro deste contexto, a
circunstância do sexo casual praticado entre ele e uma jovem funcionária da
galeria onde ocorre sua exposição colabora para indicar o atual abismo de
diferença que o distancia de sua velha paixão. Enquanto ela vive em
estabilidade financeira e emocional – pelo menos até então – ele, ainda aberto
para aventuras, está em processo de iniciação de uma carreira – embora pairem
dúvidas nele quanto a transformação do seu carinho pela fotografia em ofício.
Isto posto, é a partir do
desconforto e atual diferenciação existente entre aquele antigo par que o
conflito de Permanência se desenvolve
de maneira introspectiva, com racionalidade e sem alarde. Tão frustrante quanto
verdadeiro.
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1. Teoria e Prática do Roteiro. São Paulo: Globo,
1996. p. 82-3.
FICHA TÉCNICA
Direção e Roteiro: Leonardo Lacca
Elenco: Genésio de Barros, Irandhir
Santos, Laila Pas, Rita Carelli, Sílvio Restiffe
Produção: Emilie Lesclaux
Fotografia: Pedro Sotero
Montagem: Eduardo Serrano
Trilha Sonora: Jon Wygens
Estreia: 28/05/2015
Duração: 85 min.
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