Eu, Tonya
Sem Estofo
O trailer de Eu, Tonya
traz em seu bojo a transcrição de um artigo que afirma ser este ”Os Bons Companheiros da patinação”. A
comparação cria uma expectativa que infelizmente não é satisfeita, haja vista
que falta estofo ao diretor Craig Gillespie para compor um trabalho frenético aos moldes do que
faz com inegável competência Martin Scorsese, afinal, os cortes, músicas,
quebras da quarta parede e piadinhas são por aquele primeiro empregados com
tamanho excesso que a carga dramática da história de Tonya Harding resta
diluída, ou, como escreve Renato Furtado em texto ora transcrito por analogia: “entre as cenas de ação e as gags, quase não
sobra tempo para construir o drama”¹.
Eu, Tonya, dentro deste contexto, se esmera
para alcançar notas semelhantes a realização de Scorsese², porém, a impressão
que fica é a de que Gillespie se enamora tanto das técnicas narrativas manejadas,
sobretudo, no que tange fotografia, edição e trilha sonora que acaba esquecendo
de dar a devida atenção a construção dos personagens e ao delineamento do
clímax, o que faz a sucessão de fatos contados soar por vezes atabalhoada –
vide o exemplo do amigo do ex-marido da patinadora que, embora seja de grande
importância à trama é nela inserido de modo abrupto e sem qualquer menção a seu
passado/origem. Ademais, pesa de forma incômoda a saída de cena da mãe da
protagonista que, apesar de presente em quase todas as tomadas da primeira
metade do longa-metragem é posta de lado na fração seguinte, o que compromete o
rendimento da obra, a despeito da qualidade da premiada performance da atriz Allison Janney. A essa questão do desempenho acima da média que por vezes resta prejudicado
pelo roteiro também pode ser incluída a atuação de Margot Robbie que, por
certo, tinha chances de ser ainda melhor caso maior fosse a preocupação da obra
com o estudo de personagens e seus respectivos arcos dramáticos³ - seja como
for, a artista novamente demonstra deter um interessante potencial que ainda haverá
de presentear o público com muitos outros belos desempenhos quanto mais madura
for se tornando.
Não resta dúvida que a história de Tonya Harding é
cinematográfica e que a produção – ecoando trabalhos dos irmãos Coen – bem se apropria
da aura de idiotice que rodeou o evento mais marcante da vida da atleta,
contudo, mais do que uma trama abobalhada há muito drama e denúncia de
violência contra a mulher em seu miolo, elementos esses que Eu, Tonya não consegue manusear a
contento talvez por receio de em assim fazendo resultar menos pop e divertido. Quem
viu, por exemplo, O Lobo de Wall Street (EUA,
2013) do supracitado Scorsese ou até mesmo Django
Livre (EUA, 2012) de Quentin Tarantino, sabe que uma coisa não necessariamente
precisa prevalecer sobre a outra.
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1. Como o
escapismo de Vingadores: Guerra Infinita reflete nossa sociedade (Análise). Íntegra disponível em http://www.adorocinema.com/noticias/filmes/noticia-139814/?page=2.
Acesso em 07/05/18.
2. Dito isso, um filme que pode com justiça ser equiparado
ao título de Scorsese é Boogie Nights
(EUA, 1997) de Paul Thomas Anderson,
seja pela equivalência de conteúdo, visto que também se trata de um enredo de
ascensão e queda, seja pela excelência com que mistura planos sequências
intrincados com edição ágil, trilha musical utilizada, estrategicamente, tal
como um personagem extra e elenco escolhido com precisão.
3. É uma pena que
a elogiada atuação de Margot Robbie não seja capaz de por si só camuflar a
falta de adequação etária da mesma ao papel, já que não é possível comprar a
ideia de que a mesma aparenta ter o intervalo de 15 a 23 anos de idade da
personagem principal, o que, consequentemente, impede a total imersão na obra,
problema que, com orçamento suficiente, poderia ser solucionado com o emprego
de efeitos visuais parecidos com os vistos em O Curioso Caso de Benjamin Button (EUA, 2008).
Ficha Técnica
Título Original: I, Tonya
Direção: Craig
Gillespie
Roteiro: Steven Rogers
Produção: Bryan Unkeless, Margot Robbie, Steven Rogers, Tom
Ackerley
Elenco: Al Bianchi, Allison Janney, Alphie Hyorth, Amy Fox,
Annie Livingston, Anthony Reynolds, Bobby Browning, Bobby Cannavale, Bojana
Novakovic, Brandon O'Dell, Caitlin Carver, Cara Mantella, Cecil Love, Cory
Chapman, Dan Triandiflou, Daniel Thomas May, Davin Allen Grindstaff, Jan
Harrelson, Jason Davis, Joshua Mikel, Julianne Nicholson, Kelly O'Neal, Lisa
Kaye Kinsler, Luray Cooper, Lynne Ashe, Maizie Smith, Margot Robbie, Mckenna
Grace, Mea Allen, Miles Mussenden, Paul Walter Hauser, Ricky Russert, Sean
Goulding, Sebastian Stan, Steve Wedan, Suehyla El-Attar
Fotografia:
Nicolas Karakatsanis
Trilha
Sonora: Peter Nashel
Montagem:
Tatiana S. Riegel
Estreia: 15/02/2018
(Brasil)
Duração:
120 min.
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