Venom


Equívoco Retumbante

Venom é um dos personagens mais contestados e desinteressantes do universo pertencente ao Homem-Aranha, face uma comprometedora característica sua: a carência de nuances, sobretudo psicológicas, que o permitam se igualar em peculiaridade a figuras como Duende Verde, Dr. Octopus e Rei do Crime, alguns dos mais célebres algozes do aracnídeo. A despeito desse panorama, o simbionte teve sua estreia na tela grande em Homem Aranha 3 (EUA, 2008), para o incômodo de Sam Raimi que jamais escondeu sua insatisfação com a figura, bem como com o fato de ter sido obrigado pelo produtor Avi Arad a incluí-lo no filme. Ocorre que por mais aquém do esperado que tenha sido o resultado da obra - principalmente quando comparada com a produção que a antecedera - uma conclusão é inafastável: o trabalho de Raimi no mínimo respeitara a essência do personagem, qual seja a de um vilão sem requinte disposto a tudo para exterminar o cabeça de teia e quem possa representar obstáculo a esse intento.

É sabido que ao longo da década de 1990 Venom foi sendo humanizado até ser transformado em anti-herói, toada essa da qual o longa-metragem Venom (EUA, 2018) se apropria para, desta feita, moldar um protagonista capaz de levar aos cinemas tanto os iniciados quanto aqueles que nunca antes ouviram falar do personagem. Desse modo, o diretor Ruben Fleischer entrega um inexpressivo e genérico filme de origem que, não bastasse a questionável exclusão da presença do Homem-Aranha em tal gênese, é marcado pela pífia tentativa de fazer o vilão soar como alguém do bem - tal como, por exemplo, ocorrera em Esquadrão Suicida (EUA, 2016) - tamanha a pressa com que tal desconstrução de caráter é realizada.
Neste passo, enquanto num instante Venom se mostra um sanguinário interessado em acabar com a raça humana, pouco adiante já se revela piedoso e preocupado com o bem alheio tão somente por ter se afeiçoado ao seu hospedeiro. Destarte, a não ser que tenha sido mutilado na sala de edição, o roteiro beira o amadorismo haja vista os mastodônticos buracos¹, clichês² e soluções estapafúrdias³ por ele apresentadas. Ademais, como se não fosse suficiente a forma equivocada com que o comportamento de Venom é alterado – a ponto de se tornar engraçadinho tal qual um Peter Parker – o desenvolvimento do enredo não apresenta um traço de originalidade ao passo em que se ampara por completo nas narrativas de Alien, o Oitavo Passageiro e O Médico e o Monstro, fadando a trama, por óbvio, a previsibilidade.
Dito isso, é uma pena ver um ator talentoso como Tom Hardy se envolver com um projeto tão irregular e, consequentemente, fracassar de maneira tão retumbante em sua iniciativa de se tornar um astro pop. Reconhecimento de crítica o artista já detém, motivo pelo qual se insistir em trabalhos de apelo popular dessa espécie, poderá, tal qual um Nicolas Cage, perder o prestígio até então possuído ou, ao contrário, ter a sorte de dar uma reviravolta ao modo Ryan Reynolds que, vale lembrar, um dia estrelara Lanterna Verde (EUA, 2011) para em seguida brilhar em Deadpool (EUA, 2016). O segredo do sucesso, por certo, começa com um roteiro minimamente coerente.
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1.   Aspecto esse que pode ser exemplificado pela seguinte incongruência: se no início o título mostra a dificuldade que os simbiontes tem de encontrar hospedeiros duradouros, de um ponto em diante isso deixa de ser um problema passando qualquer humano a servir como uma morada longeva e compatível para os corpos alienígenas.
2.  Neste diapasão, a história é contada do modo mais protocolar possível> mediante uma montagem paralela que se reveza entre o desenvolvimento do mocinho e do vilão e que lembra, aliás, a fórmula semelhante utilizada por Sam Raimi quando do primeiro Homem-Aranha.
3.   Vide a “explicação” dada para a forma como o inimigo de Venom tem seu corpo invadido, qual seja uma inexplicável reunião com uma criança que trazendo consigo um simbionte adentra sem qualquer dificuldade na empresa daquele e vai inexplicavelmente ao seu encontro como se programado estivesse.

Ficha Técnica

Direção: Ruben Fleischer
Roteiro: Scott Rosenberg, Jeff Pinkner, Kelly Marcel, Todd McFarlane, David Michelinie e Will Beall.
Produção: Avi Arad, Amy Pascal, Matt Tolmach
Elenco: Al-Jaleel Knox, Brandon Morales, Christian Convery, Donald K. Overstreet, Gail Gamble, Jane McNeill, Jenny Slate, Mac Brandt, Marcella Bragio, Michelle Fang, Michelle Lee, Michelle Williams, Reid Scott, Riz Ahmed, Sam Medina, Scott Deckert, Scott Haze, Sope Aluko, Tom Hardy, Wayne Pére, Woody Harrelson
Fotografia: Matthew Libatique
Trilha Sonora: Ludwig Goransson
Montagem: Alan Baumgarten, Maryann Brandon
Estreia no Brasil: 04.10.18               
Duração: 112 min.

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