Natalie Wood: Aquilo que Persiste

Retrato Parcial
As condições até hoje inexplicadas da morte de Natalie Wood fazem deste o possível maior mistério de Hollywood. Dentro deste contexto, Natalie Wood: Aquilo que Persiste (EUA, 2020) não busca responder perguntas, preferindo, ao invés disso, trilhar uma linha narrativa conduzida segundo o olhar de uma das filhas da atriz, o que resulta na omissão de pontos relevantes, ainda que constrangedores, bem como em um nítido esforço para inocentar aquele que por muito tempo foi considerado suspeito de ter assassinado a artista, qual seja seu então marido Robert Wagner.

Nesta toada, o filme deixa de analisar o histórico de abusos sofridos pela atriz - e que, por certo, poderiam ajudar o espectador a entendê-la melhor - no que se inclui um questionável namoro aos 16 anos com Nicholas Ray, que à época com 44 anos dirigia a adolescente em Juventude Transviada (1955), bem como o boato sobre o dia em que fora supostamente estuprada por Kirk Douglas. O documentário, aliás, até apresenta uma entrevista na qual a celebridade é questionada se em algum momento fora obrigada a fazer algo desagradável para algum figurão do cinema, imdagação que a deixa visivelmente abalada e que a faz dar uma pouco convincente resposta negativa. Isto posto, é uma pena que a produção se contente em reproduzir tal cena e não aproveite para em seguida explorar as possibilidades por ela abertas – o que não se confunde com confirmar ou negar os boatos. Em síntese, o filme perde a oportunidade de encarar uma temática de considerável valor social, o subjugo de mulheres em uma indústria patriarcal, deixando, de quebra, um buraco na sequência histórica dos eventos, tamanha a dificuldade que existe para dissociar o nome da atriz de tais circunstâncias.
Não bastasse tal lacuna, o longa-metragem ainda deixa de considerar pormenores polêmicos relacionados ao casamento de Natalie Wood que pelo visto não era tão feliz quanto aparentava, dada a provável bissexualidade de seu consorte e o suposto affair da estrela com o colega de trabalho Christopher Walken¹ que, inclusive, acompanhava ela e respectivo esposo no fatídico passeio de barco que culminou na morte dessa.
Natalie Wood: Aquilo que Persiste, ignora, portanto, os meandros citados - fechando os olhos até mesmo para o teor de testemunhos de pessoas que afirmam ter ouvido gritos de socorro da atriz pouco antes de morrer² - e dá-se por satisfeito apenas com um relato raso acerca do incidente prestado por alguém que, um dia suspeito, tem sua inocência defendida neste trabalho, empenho que não precisaria ser criticado contanto que o título, ao invés de jogar assuntos espinhosos para baixo do tapete, tivesse o brio de enfrentá-los. Talvez por respeito a outras pessoas, o documentário acaba sendo negligente perante quem deveria ser sua prioridade: a biografada.
______
1.Conforme os termos da mais recente biografia da atriz. Mais sobre o tema pode ser encontrado em https://revistamonet.globo.com/Noticias/noticia/2020/03/flagrante-de-natalie-wood-do-marido-robert-wagner-com-o-mordomo-pode-ter-motivado-desaparecimento-da-atriz-no-mar-revela-livro.html. Acesso em 01/06/2020.
2. Neste sentido, reportagens sobre o assunto podem ser lidas em https://www.foxnews.com/entertainment/natalie-wood-mystery-witness-says-she-heard-woman-scream-help-me-im-drowning e https://www.vanityfair.com/news/2000/03/natalie-wood-s-fatal-voyage. Acesso em 01/06/2020.

FICHA TÉCNICA

Título Original: Natalie Wood: What Remains Behind
Direção: Laurent Bouzereau
Estreia: 05/05/2020
Duração: 100 min.

Comentários

LEIA TAMBÉM