Era Uma Vez Eu, Verônica
Nada
Padronizado
Uma recente trinca de filmes
pernambucanos funcionou para não só abrilhantar o cinema brasileiro como também
consagrar de vez a produção cinematográfica de um Estado que, desde o ciclo
regional vivido nos anos 1920, não experimentava de novo semelhante boom. As obras em questão são Febre do Rato, de Cláudio Assis, O Som ao Redor de Kleber Mendonça Filho,
e Era Uma Vez Eu, Verônica de Marcelo
Gomes. Uma vez que os dois primeiros títulos já foram abordados neste espaço¹,
a análise em tela se debruçará sobre o terceiro que, ao contrário dos demais,
se dedica mais aos problemas do interior do indivíduo do que sobre as mazelas
de uma sociedade.
A filmografia de Marcelo Gomes
prima por uma linguagem particular que dribla o feijão com arroz cinematográfico
com o qual muitos já se acostumaram. O diretor, assim como na música Mira Ira da também nordestina Karina
Buhr, repudia o fato de que está “tudo
padronizado” e mais uma vez entrega um trabalho que experimenta formas
novas sem deixar de lado a comunicação com o público, além, é claro, de ser imensamente
sincero quanto a abordagem de seu tema.
Dito isso, o filme logra enorme
êxito na forma como ilustra os conflitos vivenciados pela protagonista no
momento de transição definitiva para a vida adulta². Assim, já nas duas
primeiras sequências iniciais vê-se que a vida desregrada e “irresponsável” –
materializada na encenação de um sexo grupal – é logo incomodada pela chegada
do primeiro fio de cabelo branco que com ele traz um pacote novo e maior de
responsabilidades e deveres.
Some-se a isso a inversão de
papeis que Verônica tem de exercer a partir do momento em que precisa agir mais
como mãe do que como filha de seu pai enfermo e está formado o tortuoso
caminhar de uma trajetória que não necessariamente precisa ser vitoriosa mas
apenas percorrida, afinal, as fases da vida vão se renovando sem que entre elas
exista elos ou fechamentos grandiosos. Trata-se apenas de ciclos nos quais
todos nós um dia adentramos. Por isso, nem a personagem é apática nem o filme é
apolítico, pois tais definições aqui não se encaixam, tendo em vista que a
toada naturalista³ do longa-metragem nada mais é que um espelho do comportamento
de muitos de nós que, volta e meia assustados com a novidades apresentadas pela
vida, implementamos pequenas fugas e nos sentimos mais vivos por meio de
ligeiras irresponsabilidades.
___________
1. Leia
mais sobre Febre do Rato em http://setimacritica.blogspot.com.br/2012/08/febre-do-rato.html
e O Som ao Redor em http://setimacritica.blogspot.com.br/2013/02/o-som-ao-redor.html.
2.
Neste
sentido, de início somos levados a crer que a narrativa exigia uma atriz um
pouco mais nova que Hermila Guedes, porém, sua entrega é tão grande que tal
sensação logo se dissipa e percebemos que ninguém melhor que ela para ser
Verônica.
3. Exemplo desse naturalismo reside a fotografia de iluminação estourada que se desagrada aos olhos dentro da sala de cinema, por outro lado, se adequa aos tons presentes no mundo real.
FICHA
TÉCNICA
Direção e
Roteiro: Marcelo
Gomes
Produção: João Vieira Jr., Sara Silveira
Elenco: Hermila Guedes, João Miguel, W.
J. Solha, Renata Roberta, Inaê Veríssimo
Trilha
Sonora: Karina
Buhr e Tomaz Alves Souza
Fotografia: Mauro Pinheiro Jr.
Ano: 2012 Estreia: 16.11.2012
Duração: 90 min.
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