Belém aos 80
De Boas Intenções...
Por mais óbvio que possa
parecer, vale a pena lembrar: a análise crítica de um filme requer o devido
afastamento entre razão e emoção. Dito isso, no que tange a avaliação do documentário
Belém aos 80 (Brasil, 2007) é
impossível ignorar que suas boníssimas intenções não superam as limitações e deficiências
presenciadas ao longo de seus cento e sete minutos, senão vejamos.
A importância envolta no
registro da atividade cultural paraense é inquestionável seja para fins de
memória e valorização de seus artistas e obras, seja como instrumento de
informação e formação das gerações futuras. Neste diapasão, o longa-metragem dirigido
por Alan Kardek Guimarães, com esteio em
argumento de Januário Guedes e Celso Eluan, elege como tema os diversos movimentos artísticos que pulularam na
cidade das mangueiras ao longo da década de 80, no que se incluem produções
literárias, fotográficas, musicais, teatrais e cinematográfica, além de
experimentações vistas no campo das artes plásticas e organizações populares
voltadas para festas e blocos de rua. O problema, dentro deste contexto, é que
não há uma separação, digamos, didática, entre cada uma dessas vertentes e, o
que é pior, certos eventos são narrados sem qualquer preocupação com explicações
pretéritas, o que, convenhamos, se configura como um equívoco visto que nenhum
espectador é obrigado a possuir conhecimento prévio sobre os assuntos
levantados. Por isso, surge naturalmente a dúvida: será esse um trabalho feito exclusivamente
para o deleite daqueles que protagonizaram as histórias contadas ou será, de
modo contrário, apenas o caso de uma tentativa frustrada de comunicação
coletiva?
Não bastassem tais
problemas, a pretensa conexão entre o processo de redemocratização implantado
no país e o surgimento dos levantes artísticos belemenses soa pouco
convincente, eis que no lugar da conotação política representada pelo fim do
governo militar e da ditadura, mais parece que era simplesmente na boemia que se
concentrava o estímulo e a essência de muitas das criações abordadas. Para
piorar, o amadorismo de certas tomadas sobrepõe qualquer afã vanguardista da
filmagem – isso porque existe uma diferença abismal entre o que se pode chamar
de estilo e o que na verdade é tosco. Desta feita, a inclusão no plano/quadro de
microfones e câmeras e a alternância entre formatos de vídeo numa mesma
sequência são exemplos de falhas grosseiras que não se justificam tão somente
por se tratar de linguagem documental, não havendo, portanto, conotação
naturalista capaz de camuflar aquilo que, na verdade, é amador ou,
simplesmente, fruto de mau gosto.
Ante o exposto, Belém aos 80 titubeia no conteúdo e
tropeça quanto a forma, desperdiçando, assim, assuntos riquíssimos da recente
história cultural paraense. Exemplo dessa fraqueza, por fim, reside no lamentável
pequeno espaço dado para a cena rocker
surgida na cidade àquela época. Assim, dentre as tantas bandas citadas pela
produção apenas uma, o Álibi de Orfeu,
recebe a atenção devida – em detrimento de outros importantes grupos como Stress e Mosaico de Ravena -, ficando, por conseguinte, a impressão de que
um outro recorte neste sentido poderia até render um novo filme. Quem sabe um
dia?
Direção e Roteiro: Alan Kardec Guimarães
Argumento: Januário Guedes e Celson Eluan
Fotografia: Diógenes de Carvalho Leal
Duração:107 min.
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