Espero Tua (Re)Volta


A Recente História Nacional
Tendo por ponto de partida as manifestações populares de 2013 que, como sabido, clamavam pela redução da tarifa do transporte público (dentre outras causas) para em seguida se debruçar sobre as ocupações estudantis realizadas dois anos depois em combate a política educacional do governo do Estado de São Paulo, Espero Tua (Re)Volta (Brasil, 2019)¹ discorre sobre tal período por intermédio de três jovens narradores precisamente selecionados como representantes de um todo permeado de peculiaridades, análise essa que, auxiliada por uma edição não menos que estupenda, compõe não só um painel tanto didático quanto contundente da recente história nacional² como também um discurso capaz de expressar as inquietações do movimento estudantil, no que se inclui a discussão de valores políticos, sociais, econômicos, culturais e comportamentais, daí o longa-metragem se espraiar por assuntos que vão desde as mudanças de paradigmas de ordem sexual até o preconceito com que pobres e negros lidam em seu cotidiano, formando, desta feita, um conjunto de observações que expõe quem são e o que almejam os jovens das classes baixa e média em meio a um Brasil que insiste em lhes dar as costas e a emperrar as atividades das organizações nacional e estaduais dos estudantes que, um dia bastião da resistência contra formas de opressão e de descaso demonstradas por União, Estados e municípios, agora são objetos de perseguição do atual governo federal que, conservador, não mede esforços para implantar uma agenda de combate àquilo que compreende por marxismo cultural³, daí o empenho para acabar com entidades que fomentem o raciocínio crítico e que incentivem pessoas a não se conformar com o lugar que lhes são impostos.
Não a toa Espero Tua (Re)Volta se mostra tão angustiante por ocasião da proximidade de seu término quando argumenta que as conquistas resultantes das muitas batalhas travadas por jovens brasileiros desde antes de 2015 restam ameaçadas face a eleição de Jair Bolsonaro. Resta rogar para que se repitam, sempre que necessário, levantes semelhantes aos mostrados na obra, tal como suplica seu título.
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1. Para alguns desavisados o documentário pode soar de imediato como um trabalho fulcrado no improviso e carente de recursos técnicos, impressão que felizmente cai por terra logo alguns minutos após o início do filme momento no qual já é possível constatar o grau de qualidade e de profissionalismo do trabalho de captação de imagem e de som direto da equipe capitaneada pela diretora Eliza Capai que também conta com poderosos registros de arquivo, como bem observa a cineasta: “A parceria com a Globo nos abriu a possibilidade de uso do arquivo da emissora. A parceria com a Globo nos abriu a possibilidade de uso do arquivo da emissora. [...] Em paralelo com isso, [...] fui atrás dos documentaristas que haviam gravado dentro das ocupações de 2015 contra a reorganização das escolas proposta pelo governo de Geraldo Alckmin. E foi muito interessante, porque eu não entrei pessoalmente nas ocupações, mas através do material de tantos documentaristas que acompanharam aquele momento, eu comecei a ter pontos de vista diferentes do que cada um notava ali de dentro” (O novo movimento estudantil brasileiro no filme “Espero tua (Re)volta”, de Eliza Capai. Disponível em http://desacato.info/o-novo-movimento-estudantil-brasileiro-no-filme-espero-tua-revolta-de-eliza-capai/. Acesso em 18/09/2019).
2. Tal panorama compreende, além de outros assuntos, uma breve crítica ao Partido dos Trabalhadores enquanto ocupante da presidência da república seja pelos escândalos de corrupção protagonizados, seja pela aliança com Michel Temer, o que acabaria por, segundo a interpretação de muitos, acarretar o impeachment de Dilma Rousseff.
3. Mais informações sobre o assunto em O marxismo cultural de Olavo de Carvalho começa antes de Marx!, por Rogério Maestri disponível em https://jornalggn.com.br/artigos/o-marxismo-cultural-de-olavo-de-carvalho-comeca-antes-de-marx/. Acesso em 18/09/2019).
4. Dentro deste contexto, as entidades estudantis vêm sofrendo uma estratégia empregada para lhes deixar debilitadas e, consequentemente, sem poder de fogo e de articulação: a diminuição da fonte de renda oriunda da taxa cobrada para emissão da carteira de identificação estudantil, visto a iniciativa oportunista da presidência da república em oferecer o documento sem custos para o alunado - neste sentido, a Nota dos presidentes a UNE, UBES e AANPG sobre o tema pode ser visualizada em https://une.org.br/noticias/nota-dos-presidentes-une-ubes-e-anpg-sobre-carteira-do-estudante-do-governo/ (acesso em 18/09/19).

FICHA TÉCNICA

Direção e Roteiro: Eliza Capai
Montagem: Eliza Capai e Yuri Amaral
Fotografia: Eliza Capai e Bruno Miranda
Produção Executiva: Mariana Genescá
Narração: Lucas “Koka” Penteado, Marcela Jesus, Nayara Souza
Trilha Sonora: Décio 7
Estreia: 15/08/2019
Duração: 93 min.

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