Blue Jasmine



Valeu a Espera

Convenhamos, Woody Allen não apresentava uma grande obra desde Tudo Pode Dar Certo (EUA, 2009). Embora não faça tanto tempo assim, o intervalo parece maior do que de fato é porque o prolífico diretor lançou de lá para cá os esquecíveis Você Vai Conhecer o Homem dos Seus Sonhos (EUA, 2010) e Para Roma Com Amor (EUA/Itália/Espanha, 2012), além de Meia Noite em Paris (EUA, 2011) que a muitos enganou quando na verdade não passara de uma repetição do viés fantasioso utilizado anos atrás em A Rosa Púrpura do Cairo (EUA, 1985).

Dito isso, Blue Jasmine (EUA, 2013) é o tipo de trabalho que faz a espera e os títulos medianos valerem a pena. Não se trata aqui de dizer que o diretor recuperou a boa forma porque é natural numa filmografia tão vasta a convivência de grandes realizações com outras menores. Neste passo, o que torna sua mais nova obra digna de reverências é o fato de ser a que talvez melhor proceda a fusão entre drama e comédia experimentada pelo diretor ao longo das décadas¹ – Zelig (EUA, 1983) também o fez, porém, não se concentrou apenas nessa missão mas também na construção de uma narrativa falsamente documental, qual seja o denominado formato mockumentary.
Dentro desse contexto, o estado blue de Jasmine, motivado por uma derrocada social, econômica e afetiva, é acompanhado com o olhar terapêutico dos tempos em que Allen emulava seu ídolo Ingmar Bergman, ao mesmo tempo em que a ironia empregada acrescenta acidez a narrativa de um modo tão deliciosamente debochado que ao cineasta é permitido até a exposição de suas preferências, sem que isso resulte em incômodo para o espectador, isso porque, conforme conclui Isabela Boscov acerca do tratamento dado a Jasmine: “Allen só finge que a deplora. Na verdade está com ela e não abre: as pessoas são mesmo um pavor, São Francisco não se compara mesmo a Nova York e não ter fortuna é mesmo uma droga”².
Por certo, ao deliberadamente se dedicar ao ponto de vista da protagonista, o diretor a torna compreensível, na medida do possível, e, sobretudo, não execrável, o que humaniza o drama daquela e torna cômico o choque de culturas por ela enfrentado. Ademais, se Blue Jasmine é uma dramédia ótima quanto ao equilíbrio de gêneros, o êxito se deve a enxuta escrita de Allen bem como ao azeitado elenco por ele reunido, no que se destaca Cate Blanchett num momento indiscutivelmente iluminado, tal como ao eficiente trabalho de edição que afasta o filme da linearidade normalmente presente nas produções do cineasta.
Isto posto, Blue Jasmine atesta que um bom Woody Allen ainda deixa no chinelo muitos dos que rotineiramente tentam em vão imitar seu estilo de apontar e fazer graça onde dificilmente imaginamos haver.
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1.     Neste sentido, Luiz Carlos Merten afirma: ”O segredo de Blue Jasmine é que Woody Allen volta à densidade da sua grande fase – Dostoievski, Crime e Castigo, etc. –, mas com a leveza da fase recente” (FONTE: http://www.estadao.com.br/noticias/arteelazer,blue-jasmine-e-o-melhor-filme-de-woody-allen-em-muito-tempo-,1096798,0.htm. Acesso em 24.12.2013).
2.     Revista Veja. Ed. 2348. Ano 46. N° 47. São Paulo: Abril, 20.11. 2013. p.139.

Ficha Técnica

Direção e Roteiro: Woody Allen
Produção: Letty Aronson, Stephen Tenenbaum, Edward Walson
Elenco: Cate Blanchett, Alec Baldwin Bobby Cannavale, Louis C.K., Andrew Dice Clay
Sally Hawkins, Peter Sarsgaard, Michael Stuhlbarg
Estreia: 23.08.2013                                                Estreia no Brasil: 15.11.2013
Duração: 98 min.

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