Victoria
Discrição
O que Victoria (Alemanha, 2015) possui de
simples em seu enredo apresenta, em compensação, de complexo quanto a forma com
que aquele fora transformado em imagens, afinal, como sabido, durante seus 134
minutos não há um corte sequer em seu take.
Neste passo, há de ser
dito que a simplicidade da trama sobre a jovem estrangeira que há pouco tempo
em Berlim se envolve num assalto após conhecer as pessoas erradas possui uma
capacidade de comunicação universal não dotada, por exemplo, por outro
longa-metragem conhecido por também ser composto de um só plano sem corte, qual
seja A Arca Russa. Enquanto a
exuberante realização de Aleksandr
Sokurov, para uma completa
absorção, exige do espectador certa dose de conhecimento prévio sobre a
história da Rússia, em Victoria o único
desafio imposto a plateia consiste em suportar a primeira metade de sua duração,
eis que desenvolvida de maneira arrastada embora inevitável seja reconhecer
este mal como necessário na medida em que estabelece as conexões entre os
personagens e justifica seus comportamentos e escolhas. Contudo, vencida essa
etapa inicial, Victoria adentra numa
espiral de tensão, recompensando, assim, a paciência do público que segue, então,
preso a cadeira.
Com efeito, há de ser
enfatizado que em nenhum de seus dois atos a produção faz do plano-sequência um
recurso a ser obrigatória e frequentemente constatado. A bem-vinda discrição
nesse sentido destoa do que, por exemplo, fora visto em Birdman (EUA,
2014)¹, filme cujos movimentos de câmera funcionam quase
que como um personagem a narrar a trama; em Victoria,
ao contrário, a câmera privilegia os planos fechados acompanhando o elenco
quase sempre muito próxima a ele, o que não significa dizer que, por isso, a sua
condução de câmera deva ser menos saudada. Dentro deste contexto, um olhar
atento consegue perceber que, apesar de modestamente não buscar se vangloriar
de seu feito, o diretor Sebastian Schipper regeu um trabalho de complicadíssimo
modus operandi e logística principalmente
no que se refere a questão da iluminação, haja vista que suas cenas externas acompanham
com perfeição ímpar a transição da madrugada para o inicio de uma manhã de sol,
ao passo que suas “tomadas” internas percorrem espaços ora subterrâneos – como a
garagem de um prédio e a danceteria onde na penumbra desfilam tipos diversos –
ora exíguos – como o interior de elevadores – sem que nenhum traço de qualidade
da imagem se perca. Ademais, caso a inserção de falas e ruídos não tenha sido
realizada exclusivamente durante a pós-produção, a devida menção elogiosa há,
portanto, de ser igualmente garantida a equipe de captação de som direto, dada
a dificuldade de utilização de microfones em filmagem tão adversa para tanto.
Victoria é, desta feita um trabalho de notável requinte técnico que não se
deslumbra consigo mesmo, o que, há de se convir, é um feito e tanto que em
última instância transparece uma crucial
característica que não raro diferença as produções europeias das
norte-americanas: a falta de egolatria.
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1. Leia mais sobre Birdman Ou (A Inesperada Virtude Da Ignorância) em http://www.setimacritica.blogspot.com.br/2015/05/birdman-ou-inesperada-virtude-da.html
Ficha Técnica
Direção: Sebastian Schipper
Roteiro: Eike Frederik Schulz, Olivia Neergaard-Holm,
Sebastian Schipper
Elenco: Adolfo Assor, André Hennicke, Andreas Schmittka, Anna
Lena Klenke, Anne Düe, Ansgar Ballendat, Bernd Weikert, Burak Yigit, Daniel
Fripan, David Micas, Eike Frederik Schulz, Franz Rogowski, Frederick Lau,
Hans-Ulrich Laux, Jan Breustedt, Laia Costa, Martin Goeres, Max Mauff, Nadja
Laura Mijthab, Philipp Kubitza, Timo Honsa
Produção: Anatol Nitschke, Catherine Baikousis, Christiane
Dressler, David Keitsch, Jan Dressler, Sebastian Schipper
Fotografia:
Sturla Brandth Grøvlen
Montagem:
Olivia Neergaard-Holm
Trilha
Sonora: Nils Frahm
Estreia
Brasil: 24.12.2015
Duração: 138 min.
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