Entre-Laços
Manipulação Disfarçada
Apesar de aparentemente sutil na forma com que trata assuntos
como transexualidade, homossexualidade e preconceito, é inegável que o roteiro
de Entre-Laços (Japão, 2017) possui
um quê de manipulador ao passo que cria uma série de situações, não raro de
desfechos previsíveis, voltadas a angariar a simpatia do público pela causa da
diversidade sexual. Por óbvio, a importância de discursos que batam de frente
com a agenda conservadora que tanto segrega e oprime é inconteste, daí que a crítica
ora levantada gira em torno não de tal iniciativa e sim do modo pouco natural como
é a mesma concretizada e que acaba por agregar ao longa-metragem certo tom
novelesco.
Dentro deste contexto, é curioso como a personagem transexual
Rinko (Toma Ikuta) resta
subaproveitada, vide a passividade de comportamento a ela conferida que a torna
um ser apático – distante, portanto, da forte protagonista de Uma
Mulher Fantástica (Chile, 2017) com a qual alguns insistem em tecer
comparações infundadas – voltado quase que exclusivamente a servir aos outros,
viés esse em que chama a atenção negativamente o quão fria é a sua relação com Makio
(Kenta Kiritani), o
homem com quem pretende se casar, afinal, a mulher trans mais parece uma babá
ou governanta de seu senhor tamanha a falta de contato e de carinho entre
ambos, cujos sentimentos de amor recíprocos são volta e meia declarados com
palavras mas quase nunca por gestos.
Nesse cenário quem de fato soa autêntica é a personagem
infantil Tomo (Rinka Kakihara) que rouba para si o protagonismo ao concentrar ao seu
redor os principais conflitos da trama que vão desde a aceitação de sua postura
homofóbica até o exercício de tolerância perante as diferenças e a tomada de posicionamento
nesse sentido no meio social. Por tal personagem ainda perpassa uma
interessante discussão sobre maternidade responsável que só não é melhor porque
nitidamente estruturada para reforçar a empatia do público pela personagem trans
- como se essa precisasse ser a pessoa mais exemplar do planeta (boa mãe,
esposa exemplar e dona de casa incansável) para só então ser aceita.
Há quem considere que o desfecho do enredo pende para o
conservadorismo, conclusão que há de ser relativizada se considerada for a
ambiguidade dos sentimentos nutridos pela criança que desolada com o abandono
da genitora se rende a esta quando de seu retorno na esperança de que o futuro
lhe reserve dias melhores. Os finais ficcionais que mais se aproximam da vida
real costumam ser aqueles que frustram o público e seu anseio pela felicidade.
FICHA TÉCNICA
Título Original: Karera ga honki de amu toki wa
Direção
e Roteiro:
Naoko Ogigami
Produção:
Kenzô Ishiguro, Masashi Igarashi, Noriaki Takagi
Fotografia:
Kozo Shibasaki
Trilha
Sonora: Naoko Eto
Montagem:
Shinichi Fujima
Estreia: 17/05/2018
Duração: 127
min.
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