O Palhaço

Que Venha Mais!

Em O Palhaço (Brasil, 2011) Selton Mello lança um olhar sobre a melancolia de um artista circense em dúvida quanto a sua vocação. Considerando que tais conceito e ambientação já haviam sido tratados, por exemplo, por Chaplin, Fellini e até mesmo Cacá Diegues em seu Bye Bye Brasil (Brasil, 1980), Selton corria o sério risco de entregar um trabalho que chovesse no molhado, sendo, assim, aquém das comparações.
Neste sentido, se em Feliz Natal (Brasil, 2008) o então cineasta estreante não negava a inspiração nas realizações de John Cassavetes, em seu segundo longa-metragem o agora diretor de televisão e cinema também não tenta camuflar suas influências, o que, além de revelar honestidade perante si e perante o respeitável público, lhe permite dar o necessário passo adiante rumo a aquisição de uma marca que lhe seja própria.
Para tanto, Selton se vale de uma precisão técnica que, somada a escolhas inteligentes, o habilitam a, sem maquinações, compor uma obra deliciosamente poética e esperançosa; daí ser possível concluir que a força de seu projeto advém menos da temática – que em momento algum se insinua inédita – e mais da forma como esta é lapidada. Um exemplo disso, cabe dizer, reside na metáfora do protagonista que, de posse tão somente da certidão de nascimento, fica angustiado ao ser rotineiramente instado a apresentar RG, CPF e comprovante de residência, ideia essa que resume de maneira brilhante a atemporal história da crise de identidade enfrentada por um ser desmotivado com o rumo da vida.
Primorosamente decupado e fotografado, O Palhaço traz em seu bojo um belo exercício de direção de arte e uma magistral trilha sonora cuja presença marcante, ressalte-se, faz a música extravasar as fronteiras da diegese, para, ato contínuo, assumir no filme uma espécie de função narradora. Por fim, no que tange a condução dos atores, o cineasta demonstra mais uma vez sensibilidade para a tarefa, a qual desta vez é cumprida com senso de humor suficiente para tornar impagáveis algumas das diversas participações especiais por ele arquitetadas – dentre as quais se destacam, por óbvio, as aparições de Moacyr Franco, na pele de um delegado mercenário, e de Tonico Pereira encarnado irmãos gêmeos um tanto quanto turrões.
Todos esses são fatores que, uma vez reunidos com eficiência por Selton Mello, acarretam para este um atestado de competência apto a afastar qualquer hipótese de limitação de seu talento ao trabalho de estreia, motivo pelo qual muito mais se pode esperar do futuro. O cinema nacional agradece.

COTAÇÃO۞۞۞۞

Ficha Técnica
Direção: Selton Mello
Roteiro: Marcelo Vindicatto e Selton Mello
Elenco: Hossen Minussi (Chico Lorota)Teuda Bara (Dona Zaira)Selton Mello (Benjamim/Palhaço Pangaré)Danton Mello (Aldo), Larissa Manoela (Guilhermina)Giselle Motta (Lola)Paulo José (Valdemar/Palhaço Puro Sangue)Thogun (Gordini)Fabiana Karla (Tonha)Tonico Pereira (Beto/Deto Papagaio)Moacyr Franco (Delegado Justo)Tony Tonelada (Meio Quilo)Renato Macedo (Borrachinha)Ferrugem (Atendente da Prefeitura)Cadu Fávero (Tony Lo Bianco)Álamo Facó (João Lorota)Moacir FrancoJorge Loredo (Nei)Jackson Antunes (Juca Bigode)Bruna Chiaradia (Justine)Maira Chasseraux (Lara Lane)Erom Cordeiro (Robson Felix)Maria Manoella
Música: Plínio Profeta
Fotografia: Adrian Teijido
Direção de Arte: Claudio Amaral Peixoto
Figurino: Kika Lopes
Edição: Marília Moraes
Estreia no Brasil: 28 de Outubro de 2011
Duração: 88 min.

Comentários

  1. Quero muito assistir! Adoro os trabalhos do Selton Mello! E já que você disse que foi primorosamente decupado e fotografado aí mesmo é que eu quero ver!
    =1

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