Febre do Rato


Cru e Objetivo

O trailer de Febre do Rato (Brasil, 2011) deixava a impressão de ser o resumo de uma obra hermeticamente destinada a poucos. Ledo engano! O novo trabalho de Cláudio Assis revela, na verdade, uma crueza e uma objetividade similares as dele próprio enquanto a pessoa polêmica e contundente que é. Dessa maneira, o cineasta fala de poesia mas sem abdicar de questões envolvendo as mazelas socioeconômicas de uma metrópole.  Assim, seja em função dos personagens marginais, seja em virtude da estética naturalista¹, o longa-metragem dialoga tanto com o cinema Novo – em especial no que atine o quê de Terra em Transe (1967) nele existente – quanto com o movimento udigrudi – capitaneado por Rogério Sganzerla e seu O Bandido da Luz Vermelha (1968) – , guardando para si, porém, um elemento diferencial, qual seja a sofisticação que embala a imagem de ponta a ponta, resultado esse, vale dizer, garantido, sobretudo, pelo belíssimo trabalho de fotografia de Walter Carvalho e pela criteriosa trilha musical presente.
No que diz respeito ao roteiro, cabe salientar que a inocência caracterizadora do espírito anárquico do protagonista Zizo – brilhantemente interpretado por Irandhir Santos – é ferozmente atropelada pela truculência do Estado e seu poder de polícia, conclusão essa que pode desagradar face a ambiguidade exalada: seria essa uma visão pessimista ou moralista da sociedade? Em não sendo Cláudio Assis um artista de meias palavras, tal lacuna incomoda ao mesmo tempo que, de modo inverso, pode ser compreendida como um convite a reflexão. Com efeito, é por não se enquadrar naquilo que é rotineira e convencionalmente feito e, ainda assim, falar diretamente com um público que acaba tendo seus valores cutucados que Febre do Rato se destaca em meio a produção cinematográfica dos últimos tempos.
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1.Neste sentido, Cláudio Assis comenta: “O cinema brasileiro está careta. A televisão encaretou o cinema brasileiro. Qual é o problema de todos ficarem nus? [...] Aquelas pessoas suam, bebem, comem, amam, dormem. Simplesmente vivem e estar nu faz parte disso. Não vejo nada de agressivo e nem forçado. É apenas uma questão estética. O filme mostra como é a vida. O nu cabe ali. Faz sentido para retratar aquelas pessoas de forma naturalista. Não é feito para chocar ou chamar a atenção.” (PREVIEW. Ed. 33. São Paulo: Sampa, Junho de 2012. p. 9).

FICHA TÉCNICA
Direção: Cláudio Assis
Roteiro: Hilton Lacerda
Produção: Julia Moraes, Claudio Assis
Elenco: Irandhir Santos, Nanda Costa, Matheus Nachtergaele, Angela Leal, Maria Gladys, Conceição Camarotti, Mariana Nunes, Juliano Cazarré, Victor Araújo, Hugo Gila, Tânia Granussi
Fotografia: Walter Carvalho
Estreia: 22.06.2012                 
Duração: 110 min.

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