O Monge
Mar de Referências
O
Monge (França/Espanha, 2011) tem um jeitão de thriller hollywoodiano embora não
abdique da perfumaria europeia característica de sua nacionalidade. Neste passo,
tal aroma se mostra perceptível, por exemplo, nos cortes que fechando em
círculo a lente da câmera emulam um recurso comumente utilizado a época do
cinema mudo, principalmente dentro da estética expressionista de fotografia com
altos contrastes entre claro e escuro.
Não a toa a trama do religioso que tem suas
crenças testadas e aniquiladas por Lúcifer em muito se relaciona com um universo
recorrente no expressionismo alemão, qual seja o da
literatura romântico-fantástica que se debruçava
sobre experiências
irrealistas marcadas pelas jornadas de poder
de seres
destituídos de bondade, cujos desdobramentos demoníacos lhes garantiam a transição entre várias
identidades e/ou corpos conforme a necessidade de suas obsessões malévolas e de seus objetivos
violentos¹.
As referências, ressalte-se, não
param por aí, visto que:
– o pequeno trecho da freira que tem um ‘desvio de conduta’
drasticamente punido remete a personagem Suzanne do filme A Religiosa (França,
1966) - adaptação da obra do iluminista Denis Diderot comandada por Jacques
Rivette;
– o cerne do enredo, qual seja o processo que torna corrompida a
natureza e fé do monge lembra por demais os vários percalços e dramas
experimentados por Viridiana no filme homônimo de Luis Buñuel rodado na Espanha
em 1961².
Em meio a este cenário, cabe frisar
que a produção em análise é, na verdade, a adaptação cinematográfica de um
romance gótico, publicado em 1796 por Matthew G. Lewis, cujos elementos e
reviravoltas já haviam tanto sido trabalhados antes quanto retrabalhados posteriormente
em obras literárias das mais diversas, o que, por certo, justifica o quê de previsibilidade
que as vezes paira no ar, característica essa que, ao invés de ser encarada como
demérito do longa-metragem, há de ser contextualizada com base nas referências suscitadas
para que, desta feita, prevaleça na memória a toada elegante, misteriosa e
sensual do trabalho do diretor Dominik Moll.
Ante o exposto, O Monge merece ser compreendido como um
eficiente entretenimento para adultos, o que, convenhamos, é um relevante ponto
positivo, considerando que, com raras exceções, esse é um filão cada vez mais
esquecido pela indústria cinematográfica. Destaque-se, por fim, o elenco
composto por Vincent Cassel, em mais uma atuação irretocável, e Déborah
François interpretando o tipo ambíguo e sedutor que tão bem lhe cai desde o
ótimo Ao Lado da Pianista (França, 2006).
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1. Neste sentido, se destacam, a título
de exemplo, obras como As Mãos de Orlac (1924) suspense dirigido por Robert Wiene e Fausto (1926) de F.W.Murnau.
2. Leia mais sobre Viridiana e A Religiosa
em http://setimacritica.blogspot.com.br/2010/10/viridiana-religiosa.html.
Título Original: Le Moine
Direção: Dominik Moll
Produção: Michel Saint-Jean
Roteiro: Dominik Moll, Anne-Louise Trividic
Elenco: Vincent Cassel, Déborah François, Joséphine Japy, Sergi López,
Catherine Mouchet, Jordi Dauder, Geraldine Chaplin, Roxane Duran, Frédéric
Noaille, Javivi, Martine Vandeville
Fotografia: Patrick Blossier
Trilha Sonora: Alberto Iglesias
Estreia Mundial: 11.07.2011
Estreia no Brasil: 07.09.12
Duração: 101 min.
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